sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

A ROSA MAIS LINDA DO MUNDO - Contos de Andersen










 Era uma vez uma rainha que possuía no seu jardim, em qualquer estação do ano, as flores mais esplêndidas de todos os recantos da terra. Ela preferia, contudo, a rosa a qualquer outra flor; por isso cultivava todas as espécies, desde a roseira brava das matas, cujas folhas cheiram a maça, até a lindíssima rosa de Provença. Cresciam rosas nas muralhas do castelo; rosas serpeavam enlaçando as colunas e os umbrais das janelas, entravam pelos corredores, estendiam-se pelo forro das salas, diferençando-se umas das outras pelo aroma, pela forma e cor das pétalas.
   E, contudo, agora moravam naquele palácio a dor e a amargura: a rainha adoecera, e os médicos declararam que ela ia morrer.
    Mas, ainda assim, dissera o mais sábio deles:
   - Há uma probabilidade de salvação: ide em busca da mais bela rosa do mundo, aquela que é a própria expressão do amor mais sublime e mais puro. A rainha escapará à morte, se pousar nessa rosa os olhos antes que estejam apagados.
  E vinham de todos os lados pessoas que traziam rosas; gente moça e gente velha traziam rosas, as rosas mais lindas que  desabrochavam pelos jardins - mas nenhuma delas era a rosa que se buscava por toda a parte. Era preciso encontrar a flor do jardim do amor; mas qual delas, entre tantas que ali floresciam, qual seria a expressão do amor mais sublime, do amor mais puro?
   Os poetas celebravam a rosa mais linda do mundo, e cada qual enaltecia a sua. Levou-se a mensagem às mais remotas regiões do país; fez-se um apelo para que todos os corações harmonizassem suas pulsações com o ritmo do amor; cada classe social, cada idade, recebeu um apelo especial.
   - Até agora - declarou o sábio - ninguém disse o nome da flor; ninguém indicou o sítio do sarcófago de Romeu e Julieta, nem as do túmulo de Santa Walpurgis - se bem que seu aroma recende sempre em todas as canções. Nem são  tampouco as flores que brotam das lanças sangrentas de Arnoldo Winkelried, regadas com o sangue sagrado do herói morto pela pátria - ainda que não haja morte mais doce, nem rosa mais vermelha do que o sangue que brotou daquele peito. Não é ainda aquela flor milagrosa, que o homem cultivou durante dias, durante anos, em longas noites não dormidas, na vigília do seu humilde gabinete de estudo, e à qual sacrificou o verdor de seus anos - a rosa maravilhosa da ciência.
   - Pois eu seu onde vive ela - disse uma mãe feliz, que, com o filhinho nos braços, se aproximou do leito da rainha. - Eu seu onde se acha a rosa mais bela do mundo! A rosa que é a expressão do amor mais sublime, do amor mais puro, brota nas faces do meu filhinho querido, quando, revigorado pelo sono, abre os olhos e me sorri com todo o carinho.
  - Sim, é bela essa rosa - disse o sábio. - Mas há outra mais bela.
  - Sim! Há uma muito mais bela - disse outra mulher. - Vi-a eu, e não pode haver rosa mais sagrada!


                                 


 Mas era pálida, como as pétalas da rosa branca. Vi-a nas faces da rainha, que, pondo de parte a coroa, carregava nos braços o filhinho doente, naquela longa e dolorosa noite. Ela chorava, beijava-o, e rezava por ele, como reza uma mãe nas horas de terror.
   - Sim!  Sagrada e maravilhosa é, pelo seu poder, a rosa pálida da amargura; mas ainda não é essa a que procuramos.
    - Não! A rosa mais esplêndida - disse o velho e piedoso bispo - via-a eu diante do altar do Senhor. Viu-a luzir, como o semblante de um anjo. As donzelas aproximava-se da mesa do Senhor, para renovar as promessas do batismo. Nas suas faces frescas floresciam e desmaiavam rosas. Havia entre elas uma menina que erguia os olhos para o céu com a maior pureza, com todo o carinho de sua alma: era aquela a expressão do amor mais sublime, mais imaculado!
    - Bendita seja ela! - disse o sábio. - Mas nenhum de vós chegou a mencionar a rosa mais bela do mundo.
   Nesse instante entrou no quarto uma criança, o filhinho da rainha. tinha os olhos rasos de lágrimas, e trazia nas mãos um grande livro aberto: era encadernado em veludo, e tinha grandes fechos de prata.
   - Olham mamãe, escuta o que li aqui!
    E, sentando-se junto do leito, leu a criança o que estava escrito no livro sobre Aquele que se entregou a si mesmo para morrer na cruz, a fim de salvar os homens - e todas as gerações futuras.
   - Não há amor tão imenso quanto esse!
   Passou sobre as faces da rainha um reflexo de rosas. Brilhavam-lhe agora os olhos, ao ver como das folhas daquele livro surgia a rosa mais linda, a imagem daquela rosa que brotou do sangue de Cristo no tronco da cruz.
  - Vejo-a! - disse a rainha. - Nunca há de morrer quem avista essa rosa - a rosa mais bela do universo!
FIM

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