terça-feira, 19 de abril de 2016

O Camponês Pobre e a Filha Esperta - Contos de Grimm

Era uma vez um camponês tão pobre que nem terras possui, mas apenas uma choupana onde morava com sua filha única. Certo dia esta lhe disse:
    - Devemos pedir ao senhor nosso rei um pedaço de terra. O rei ficou então sabendo da miséria deles e lhes deu de presente um pedacinho de campo. Pai e filha logo começaram a lavrar sua  pequena propriedade, fazendo mil projetos para a futura safra. Quando já estava quase toda lavrada, encontraram na terra um almofariz de ouro puro.
     Escuta, - disse o lavrador à filha, - já que o senhor nosso rei foi tão bondoso dando-nos este campo, nosso dever é ofertar-lhe este almofariz.
     Mas a filha não concordou:
      - Pai, achamos o almofariz. Mas onde é que está o pilão? O rei vai perguntar por ele. E aí? O melhor é ficarmos calados.
      Mas o homem não quis ouvir o conselho e, apanhando o almofariz, o levou ao rei, contando que o haviam encontrado em seu terreno e perguntando-lhe se o aceitava como prova de sua gratidão. O rei tomou o almofariz e indagou do camponês se não havia encontrado alguma coisa mais.
    - Não - respondeu o bom homem.
     O rei, então, ordenou que trouxesse o pilão do almofariz. O camponês afirmou que não havia encontrado, mas isso de nada lhe adiantou; foi como se o vento houvesse levado suas palavras. jogaram-no a um cárcere, onde ficaria até confessar onde estava o pilão. Cada vez que os carcereiros lhe levavam pão e água - que era o alimento dos presos - ouviam o camponês murmurar:
     - Ah, se eu tivesse ouvido a minha filha! Ah, se eu tivesse ouvido a minha filha!
      Finalmente foram ao rei e lhe contaram o que o homem dizia e que se negava a comer e beber.
     O soberano ordenou que o trouxessem à sua presença e perguntou-lhe por que gritava continuamente: " Ah, se eu tivesse ouvido a minha filha!"
     -Que foi que ela te aconselhou?
    - Aconselhou-me que não vos trouxesse o almofariz, pois iríeis exigir, também, o pilão.
      - Já que tens uma filha tão esperta, eu quero conhecê-la.
      E a moça teve de ir falar com o rei. Este foi logo dizendo que, sendo ela assim tão inteligente lhe daria um enigma para adivinhar. Se o decifrasse, casaria com ela. A moça respondeu-lhe que aceitaria. E o rei continuou:
      - Apresenta-te a mim, nem vestida nem nua; nem a cavalo nem numa carruagem; nem no caminho nem fora dele. Se fores capaz disso, eu me casarei contigo.
       A jovem camponesa retirou-se e se despiu completamente,  não ficou vestida. depois apanhou uma rede de pesca, bem grande  e, metendo-se nela, cobriu-se bem, e assim não ficou nua. A seguir, alugou um burro, atou a rede à sua cauda e obrigou o animal a arrastá-la; e assim ela avançava  sem andar a cavalo nem numa carruagem. Além disso, o burro teve de andar pela beira da estrada e ela assim só tocava o solo com o dedo grande do pé e não ia nem pelo caminho e nem fora dele. Chegada ao palácio, o rei confessou que ela havia acertado tudo, satisfazendo todas as condições do enigma. Deu liberdade ao seu pai e, tomando-a por esposa, a fez dona de todas as propriedades reais.
      Passaram-se vários anos, e certo dia o rei foi a um grande desfile, num dia de festa nacional. Aconteceu, então, que alguns camponeses estacionaram seus carros em frente ao palácio, onde haviam vendido suas cargas  de lenha. Algumas das carroças eram puxadas por bois e outras por cavalos. Um dos camponeses tinham três éguas, das quais uma deu cria e, lá pelas tantas, o potrilho escapou, indo meter-se entre os bois que puxavam uma das carretas. Os camponeses, ao se reunirem, começaram a brigar e a gritar, dizendo o dono dos bois que o animalzinho só podia ser dele, enquanto o outro afirmava que o potrilho era filho de sua égua e, em consequência, lhe pertencia. A briga chegou aos ouvidos do rei, o qual sentenciou que o potro ficaria onde o haviam encontrado. Assim o proprietário dos bois passou a ser o dono, contra toda a razão. O outro camponês afastou-se, chorando a perda do seu cavalinho. Mas, como sabia que a rainha era compassiva e também tinha sangue de camponês, foi falar com ela e lhe pediu que o ajudasse a recuperar o seu potrilho.
     - Se prometes não descobrir-me, eu te ajudarei. Amanhã de manhã, quando o rei sair para revistar as tropas, para no meio da estrada onde ele passar, com uma rede de pesca, e finge que estás pescando. De vez em quando recolhe a rede e sacode-a como se estivesse cheia de peixes.
      Ensinou-lhe também o que deveria responder ao rei quando este lhe fizesse perguntas.
      E, assim, no dia seguinte, o nosso camponês ficou parado, "pescando", num lugar onde não havia água. Ao passar, o rei admirou-se muito daquilo e mandou um de seus acompanhantes para ver o que estava fazendo ali aquele louco,. O homem respondeu:
      - Estou pescando.
      O mensageiro indagou como poderia pescar num local onde não havia água e o camponês lhe respondeu:
     - Assim como dois bois são capazes de ter um potro, assim também eu posso pescar onde não há água.
      O enviado transmitiu a resposta ao rei e este fez vir o camponês à sua presença. Disse-lhe que aquela resposta não podia ser dele e mandou que confessasse logo quem era sua . Deitaram-no, então, sobre um monte de palhas e o surraram e judiaram tanto dele que o pobre acabou confessando ter sido a rainha quem lhe ensinara tudo. Ao chegar o rei ao palácio, chamou sua esposa e lhe disse:
    - Já que foste tão falsa comigo, não  quero mais saber de ti. Teu tempo de rainha passou. Volta para o lugar de onde vieste: para a tua choupana.
     No entanto, como não era tão mau como parecia, o rei disse a ela que poderia levar, como despedida, o melhor e o que mais desejasse.
     - Sim, querido esposo, - disse ela, - farei o que me ordenas.
     E beijou-o para despedir-se. Depois mandou que trouxessem em segredo, um pó para fazer dormir, que ela deitou no vinho com que ia brindar a sua partida.
     O rei bebeu um gole forte: ela, porém, apenas o provou. Pouco tempo depois, o marido mergulhou em sono profundo e ela, então, ordenou a um criado que envolvesse o rei num lençol de puro linho e que o levassem a uma carruagem que estava aguardando à porta do palácio. E assim o transportou para a sua pobre choupana. Ali o pôs em sua cama, onde ele dormiu muitas e muitas horas, até que afinal despertou e, olhando em redor, disse:
     - Meu Deus, onde é que estou?!
      Chamou os criados, mas ninguém apareceu. Passado algum tempo, sua mulher aproximou-se dele e lhe falou:
     - Meu querido senhor, mandaste que levasse o melhor e o que mais desejasse do palácio; e como para mim o melhor e o que mais quero és tu, trouxe-te comigo.
      Os olhos do rei se encheram de lágrimas e ele murmurou:
     - Minha querida, deves ser minha e eu devo ser teu para todo o sempre!
     E tornou a conduzi-la ao palácio onde, com toda a certeza, ainda vivem até hoje. FIM

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Um comentário:

  1. Este foi o primeiro livro que ganhei da minha mãe. Sempre quis relembrar este conto.
    Não sabes o quanto me fez feliz. Parabéns!

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